A tempestade (im)perfeita nas cervejarias alemãs
Entenda como a guerra da Ucrânia e os fatores energéticos impactam a produção de cervejarias alemãs e o que isso pode acarretar no mundo cervejeiro.
O conflito militar no leste europeu envolvendo Rússia e Ucrânia veio se juntar a uma série de fatores pré-existentes na Alemanha e criou uma verdadeira tempestade, no sentido negativo da palavra, para as cervejarias alemãs. Recentemente a Associação de Cervejeiros Alemães, em companhia de outras seis associações regionais, pediram ao governo alemão medidas urgentes relacionadas às políticas energéticas e econômicas, sob pena de parte das cervejarias sumirem do mapa.
Por que as cervejarias alemãs correm perigo?
Ocorre que, desde que o conflito militar teve início no leste europeu, em fevereiro de 2022, os custos de energia – leia-se eletricidade e gás natural – subiram mais de 1000%. Lembremos que a operação de uma cervejaria é altamente sensível ao custo da energia: tanto para aquecer as tinas durante a brassagem e ferver o mosto, quanto para manter os fermentadores resfriados durante a fermentação e o processo de lagering.
Além disso, todos os demais insumos também subiram consideravelmente, desde a matéria prima, como o malte, até as garrafas e embalagens de papelão. Segundo a Associação, a inflação média para as cervejarias alemãs está na casa dos 80%. Esse cenário, embora mais pungente na Alemanha, se estende a praticamente toda Europa: para não entrarem em extinção, em agosto os pubs ingleses pediram ajuda ao governo para conter a disparada dos custos de energia no país.
Paralelo a tudo isso, que por si só já seria um furacão de magnitude 5, o padrão de consumo de cerveja no país está se alterando. E para baixo. Há décadas o consumo médio anual de cerveja por habitante vem reduzindo gradualmente, possivelmente aliado ao crescimento de estilos de vida mais saudáveis, o que também explica o crescimento do consumo de cervejas sem álcool.
A preferência por cervejarias alemãs locais
O que se mantém firme e forte no país com cervejas milenares é o hábito de consumir cervejas regionais. Basta lembrar da famosa rixa entre Düsseldorf e Colônia: duas cidades separadas por um rio, onde em um lado praticamente só se toma Kölsch e no outro Altbier. Em função dessa cultura, as cervejarias alemãs têm sua produção e faturamento baseados no consumo interno e não na exportação.
Soma-se a isso o fato de que, paradoxalmente à queda de consumo, muitas microcervejarias surgiram, seguindo a tendência mundial de consumo das craft beers.
Então, com o decréscimo paulatino do consumo e o crescimento da oferta, as cervejarias se viram obrigadas a reduzir suas margens para se manterem competitivas no mercado interno. Isso não aconteceu de uma hora para outra, foi um processo que teve início sorrateiro em meados da década de 80 e parece estar chegando no ápice. E as mais atingidas serão as menores, que não tem robustez financeira e operacional para segurar um preço final baixo com altos custos de produção.
Talvez por isso a Paulaner, que tem participação do grupo Heineken, tenha adquirido recentemente a fábrica da cervejaria Oettinger e usará a planta para (se prepare) produzir refrigerante! A Oettinger, por sua vez, se limitou a dizer que a sua operação não era mais atrativa do ponto de vista financeiro.
Não gosto nem de pensar nos possíveis desfechos que todo esse cenário deixará. Seguimos na esperança de que após a tempestade virá um belo dia de sol, repleto de boas cervejas. Prost! >